O que é tecnofeudalismo?

A ideia de monopólios no capitalismo não é nova, o propio Karl Marx  dizia que o capitalismo é caracterizado pela crescente capitalização da produção, e também por uma crescente centralização da propriedade do capital social. A tradição Marxista por outro lado,  tem nomes com Hilferding, Lenin,  Kalecki, Steindl, Baran e Sweezy, acreditavam que o capitalismo de sua época era regulado, em última análise, pelos resultados do equilíbrio de forças entre os monopolistas, os trabalhadores e o Estado.

No entanto,  Hilferding e Lenin  introduziram uma nova fase do capitalismo ou "CAPITAL FINANCEIRO", que por sua vez,  também tratava disso. O termo “capitalismo monopolista” so ganhou uma notoriedade com Paul Baran e Paul Sweezy, com eles essa noção ganhou um significativo papel na renovação do interesse pela teoria econômica marxista em meados da década de 1960.

A grosso modo, a principal transformação no caráter do capitalismo, segundo Baran e Sweezy, seria a substituição da concorrência entre capitais industriais pelos monopólios, isso significaria que o peso de cada empresa nos mercados em que eram vendidas as suas mercadorias aumentaria, o que ocasionaria uma uma transformação qualitativa na sua produção. O processo de crescente concentração por meio da acumulação, esses Marxistas chamavam de concentração do capital; e o processo de crescente concentração através da concorrência, além do crédito, eles chamaram de centralização do capital.  Aqui entende-se que a acumulação é o reinvestimento do lucro em métodos de produção mais novos. 

Por sua vez,  à concorrência e o crédito, aumentam a concentração nas duas frentes. A concorrência favorece os investimentos de grande escala graças aos menores custos de produção destes, ao passo que o sistema de crédito permite que os capitalistas particulares reúnam as grandes somas necessárias a tais investimentos, isso gera um sistema predatório aonde a concentração do capital no processo de trabalho avança,  dessa forma e ao mesmo tempo, como a concorrência que destrói os capitalistas mais fracos, sem contar que o sistema de crédito permite ao forte engolir o fraco, o crédito e concorrência levam a uma concentração da propriedade dos capitais que mais do que compensa as tendências descentralizadoras que decorrem diretamente apenas da acumulação.

Depois dessa pequena exposição entramos na questão, o que é tecno-feudalismo? Bom, a tese é do economista grego Yanis Varoufakis, famoso por outras obras como "o Minitauro Global" e também por ser ex ministro das finanças da Grécia.  No seu novo livro ( Tecno-feudalismo, o sigiloso sucessor do capitalismo) ele alega que da mesma forma que o capitalismo derrubou o feudalismo e substituiu a terra pelo capital como fator dominante de produção, a emergência do tecno-feudalismo desloca o capitalismo graças ao "capital nebuloso", ou uma mutação do capital.

Segundo ele, "capital da nuvem" ( nuvem aqui são os sistemas digitais) é definido, fisicamente, como o acúmulo de máquinas, software, algoritmos baseados em IA e hardware de comunicação em rede que abrangem todo o planeta, além de  executam uma ampla variedade de tarefas, novas e antigas.

Por exemplo; ao Incitar  milhões de pessoas não remuneradas (servidores da nuvem) a trabalhar de graça (e muitas vezes inconscientemente) para repor o stock de capital na nuvem (por exemplo, carregando fotos e vídeos no Instagram ou TikTok, ou publicando críticas de filmes, restaurantes e livros) o sistema estaria em pleno funcionamento.  As  plataformas de nuvem (por exemplo, Amazon.com). ), que funcionam com a mesma rede digital que nos ajuda a apagar as luzes enquanto recomenda livros, filmes, férias, já que se utilizam IA e big data para dirigir o trabalho dos trabalhadores (proletários da nuvem) na fábrica, ao mesmo tempo que alimenta redes de energia, robôs, ccaminhões,   linhas de produção automatizadas e impressoras 3D que contornam a produção convencional.

Por sua vez, a terceira natureza do capital da nuvem combina três tipos de modificação algorítmica do comportamento, sendo uma delas ordenamento aos consumidores que reproduzam capital na nuvem (ou seja, torna-os servos da nuvem). A segunda ordena aos trabalhadores assalariados que trabalhem mais arduamente, ou seja, transforma os proletários e os membros do precariado em proletários das nuvens. E um terço substitui os mercados por feudos na nuvem. Nesse caso,  a terceira natureza do capital na nuvem dá aos seus proprietários p que ele chama de (os cloudists) um poder inteiramente novo para extrair a mais-valia produzida no sector capitalista tradicional.

As plataformas de comércio eletrônico como amazon.com ou alibaba.com não são mercados no sentido convencional.  A razão pela qual não podem ser considerados mercados é que os algoritmos das listas de nuvens conseguem isolar todos os compradores uns dos outros e todos os vendedores uns dos outros. Por  consequência, o próprio algoritmo dos cloudlists concentra o poder de colocar compradores e vendedores em contato, exatamente o oposto do que um mercado deveria ser: descentralizado. Este poder conferido ao algoritmo das listas de nuvens dá ao seu proprietário a capacidade de cobrar aos fornecedores, ou seja,  aos capitalistas convencionais grandes rendas como o aluguel da nuvem pelo acesso aos clientes.

Por fim, esses "feudos" da nuvem são plataformas de negociação digital onde os algoritmos de capital da nuvem combinam compradores e vendedores; ainda que pareçam mercados, sua centralização contínua alcançada pelo poder do algoritmo para combinar e determinar as informações completas de cada comprador e de cada vendedor claramente os transforma em uma forma de "feudo da nuvem" que pertence a quem possui o algoritmo ou o capital da nuvem. 

Cria-se uma teia aonde quem construiu a plataforma atrai servos da nuvem para desempenharem o papel de compradores, além disso, os contribuintes para seu capital na nuvem e ainda os capitalistas vassalos para desempenharem o papel de vendedores

Esse sistema de classes tecnofeudal: no tecnofeudalismo, os cloudlists um setor da classe capitalista que conseguiu acumular capital considerável na nuvem tornaram-se uma nova classe dominante e reduziram o resto dos capitalistas que não têm acesso suficiente ao capital no nuvem ao status de vassalagem. No entanto, os trabalhadores assalariados tornaram-se proletários da nuvem cada vez mais precários  e quase todos atuam como servidores da nuvem , ajudando o capital da nuvem a acumular e a construir os feudos que estão substituindo os mercados.


Fontes: 

Karl Marx, o Capital, I, cap.XXIII; O Capital, III, cap. XV; Teorias da mais-valia, III). 

Paul Baran e Paul Sweezy, o Capitalismo Monopolista. 

Yanis Varoufakis, o Minotauro Global.

Yanis Varoufakis, O Tecno-feudalismo, o sigiloso sucessor do capitalismo.




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